Investimento, no entanto, não deve ser pautado por resultados a curto prazo, dizem especialistas
Enquanto a publicidade brasileira é reconhecida no mundo inteiro, a leitura não é o hobby preferido da população do País. Uma coisa parece não ter nada a ver com a outra, mas marcas estão resgatando esta causa, que não é nova, mas permanece relevante nas discussões sobre a educação. Geralmente resguardadas por empresas de nicho e instituições governamentais e culturais, as campanhas de incentivo ganham novos discursos na voz das marcas.
Este mês, o McDonald’s lançou seis livros inéditos em parceria com a Mauricio de Sousa Produções, como parte do seu combo do McLanche Feliz. Desde que começou a utilizar o livro como plataforma em 2013, a marca distribuiu mais de 5 milhões de livros digitais e físicos de diversos autores nacionais e internacionais. Para Roberto Gnypek, vice-presidente de marketing da marca, a iniciativa ajuda a aproximar proposta global da empresa à realidade e hábitos locais.
“As famílias de hoje tem uma agenda ocupada, e essa é uma oportunidade de trazer uma linguagem e uma identificação muito proprietária e próxima do consumidor. Somos uma marca global, mas temos uma obrigação de sermos relevantes localmente, e por isso lidamos com os aspectos culturais e hábitos locais. Para nós, é importante do ponto de vista de imagem de marca e de investimento qualitativo na educação“, conta o executivo.
Uma pesquisa do Instituto Pró-Livro em parceria com o Ibope Inteligência, divulgada em março de 2016, mostra, no entanto, que a publicidade é responsável por apenas 2% das escolhas relacionadas a livros. Os dados mostram ainda que o brasileiro médio lê em média 4,96 livros ao ano. No período de realização da pesquisa, 74% da população não havia comprado nenhum livro nos três meses anteriores.
Para Marcos da Veiga Pereira, presidente do Sindicato Nacional de Editores de Livros (SNEL), as marcas podem trazer uma nova percepção sobre o tema, que vez ou outra é visto com ceticismo por parte das instituições tracionais. O investimento, no entanto, não deve ser pautado por resultados a curto prazo.
“Investir em leitura não é uma estratégia fácil, envolve a decisão de mensurar retorno a partir de um sistema de crenças que funciona a longo prazo. Este tema requer um ambiente de estímulo permanente entre empresas e organizações. Isto porque empresários são muito pragmáticos, querem ver índices e medir resultados, mas a questão do retorno do investimento social ainda é uma coisa nova para empresas”, avalia.
O Itaú Unibanco também já tem um histórico quando o assunto é leitura. Em 2012, a marca criou a campanha “Leia para uma criança”, dentro de sua plataforma voltada para crianças. Estima-se que o projeto já distribuiu cerca de 50 milhões de livros e melhorou os índices de engajamento dos consumidores com a marca nas redes sociais.
Eduardo Tracanella, superintendente de marketing do Itaú Unibanco, destaca, no entanto, que o marketing não é o objetivo final, mas um desdobramento de um programa estruturado em torno da educação e da cultura. “O que percebemos é que existia a possibilidade de escolher uma causa mais específica dentro do Estatuto da Criança e do Adolescente, e dentro deste guarda-chuva, escolhemos a leitura como uma bandeira para levantar”, conta.
Para ele, a abordagem do tema deve ser pautada pelos mesmos princípios que regem o uso de outras causas na publicidade. “Espera-se que seja uma mensagem legítima, porque é isso que traz credibilidade. Hoje existe uma busca frenética das marcas por uma causa para chamar de sua, e acho que esse é o grande problema. É preciso se aprofundar no propósito para que estes projetos surjam com naturalidade”, explica o executivo.
Em outra iniciativa recente, mas com foco em livros digitais, as marcas Globo, Amazon e Companhia das Letras lançaram livros com cenas de adaptações para TV. Na iniciativa, usuários puderam baixar títulos como Dois Irmãos, Relações Perigosas e O Canto da Sereia em seus tablets e smartphones.
Para Marcos, da Snel, o tema reflete uma preocupação mais recente das marcas com a educação e a responsabilidade social. “Nos anos 90 e 2000, surgiu a preocupação das marcas com a responsabilidade ecológica, e agora temos a questão da responsabilidade social. Quando pensamos em marketing, imaginamos a forma com que uma marca vai se beneficiar ou criar uma imagem positiva com isso. Gosto de pensar que fazem isso porque acreditam que estão ajudando a transformar uma realidade, e que as iniciativas relacionadas têm um efeito acessório para passar sua mensagem”, afirma.
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