Planejamento: um processo que precisa ser retomado para destravar o desenvolvimento


Dilson M. Barreto
Economista

O brilhante Economista e ex-condesiano Nilton Pedro da Silva sempre referenciava quando de suas palestras sobre o planejamento para o desenvolvimento: “o desenvolvimento é uma decorrência da construção de um mito: difunde-se esse mito e as pessoas, acreditando nele, lutam para que o mesmo se torne realidade”. Acontece que hoje em dia além dos sonhos deixarem de existir na prática, o mito do desenvolvimento foi sepultado faz algumas décadas. Os prenúncios de hoje ficam apenas nas palavras vazias dos governantes que não olham para o futuro, contentando-se com o curto prazo de suas medíocres gestões. Esquecem que, para haver desenvolvimento, as ações governamentais têm que ser focadas no longo prazo e de forma integrada, aliada a um processo de planejamento consistente e direcionado para objetivos estratégicos. O planejamento surge assim como uma necessidade premente para a construção de um processo de desenvolvimento. É impossível colocá-lo em prática se os governantes, arraigados à política tradicional do toma-lá-dá-cá, não acreditam na sua eficácia e na possibilidade de que, com sua aplicação, as mudanças econômicas e sociais venham ocorrer de fato.

Por sua vez, essa imperiosa necessidade de se promover o desenvolvimento para que haja progresso e bem-estar para a sociedade, traz como consequência um longo processo de formação de equipes multiprofissionais qualificadas, o que também hoje não mais existe, tornando difícil construir bases seguras para ações concretas voltadas para que a economia cresça com sustentabilidade e por longo tempo. De igual maneira, seria necessário que ao ser difundido esta nova prática de trabalho, os diversos segmentos sociais e as próprias lideranças políticas acreditassem nela. A introdução do Orçamento por Programas decorrente da Lei 4.320/64 revolucionou toda a estrutura orçamentária brasileira com a introdução de importantes conceitos como programas, projetos, atividades, abrindo os caminhos para se pensar programaticamente o desenvolvimento os País ou de uma determinada região. Todavia, a partir do desmonte do Estado brasileiro no Governo Sarney, a estrutura orçamentaria começou a ser distorcida, confundindo-se interesses reais de uma sociedade com os interesses político-eleitoreiros dos governantes. O desmonte do Estado brasileiro foi consolidado mais à frente com a introdução de políticas neoliberais voltadas para a redução ou mesmo anulação das práticas desenvolvimentistas até então em curso. Planejar passou a ser entendido como uma atividade a cargo da iniciativa privada, o que concorreu para tornarem amorfos tanto o Ministério de Planejamento como os órgãos regionais e estaduais anteriormente encarregados desse processo. O que era uma estrutura sistêmica, deixou de ser. Alterou-se a estrutura do Estado para atender ao fisiologismo político o que levou a tais órgãos se politizarem e, com a abertura política, passassem a ter donos, com atividades direcionadas para o atendimento dos interesses políticos de seus proprietários. Em consequência, as equipes técnicas foram marginalizadas, classificadas como elementos complicadores, o que serviu para consolidar as velhas estruturas socioeconômicas e políticas que pareciam estarem mortas. Nessa esteira do desfazimento, foram desfeitas as estruturas tecnoburocráticas que, inseridas dos diversos órgãos de planejamento, comandavam o processo calcado numa orientação técnica e na visão de futuro.

Tanto isto pode ser tomado como verdade que, desaparecendo as estruturas de planejamento a nível nacional e regional e esfaceladas as respectivas equipes profissionais, os órgãos estaduais foram enfraquecidos e a própria ideia de planejamento ficou totalmente distorcida, sendo materializada tão somente por dois instrumentos que, isoladamente, não materializam uma ação efetivamente planejada: a elaboração do Orçamento Anual e do Plano Plurianual. Gerou-se um vazio. Hoje, com a evolução da informática, a elaboração de tais documentos é procedida em curto espaço de tempo, sem qualquer discussão sobre necessidades e prioridades ou qualquer avaliação da eficácia dos programas e projetos anteriormente em curso. Voltar atrás é totalmente impossível. Todavia, assim o querendo os governantes, pode-se pensar e construir mecanismos novos que se adequem à atual realidade, para tanto sendo necessário tão somente vontade política e desejo efetivo de fazer a coisa certa. Focar o planejamento como prioridade, acreditar em sua eficácia para promoção do desenvolvimento econômico e social e, dentro dessa premissa, começar a trabalhar com objetividade, seria o remédio mais aconselhável para superar o processo recessivo que está se aprofundando cada vez mais. Resgatar o planejamento, montar novas equipes técnicas, qualifica-las convenientemente tendo como pressuposto pensar no futuro e as respectivas mudanças econômicas e sociais que necessariamente viriam a ocorrer, deveria ser o marco principal para a construção de um Brasil novo. Se tais pressupostos fossem absorvidos pelo Governo, quatro pontos teriam que ser perseguidos dentro de um processo de modernização e revitalização do Estado brasileiro: primeiro, motivação e a crença na construção de um processo de desenvolvimento mediante a realização de um trabalho sério e extremamente ordenado, totalmente descomprometido com compromissos político-eleitoreiros; segundo, compromisso do corpo técnico com a ação a ser realizada, para tanto exigindo-se a unidade e a qualidade técnica dos trabalhos a serem executados; terceiro, quando da institucionalização do planejamento, promover a formatação dos programas e projetos direcionados de modo que sejam alcançados os objetivos desejados; quarto, discussão sobre as necessidades e prioridades básicas do País, Estado ou região (energia, transportes, abastecimento d’água, saneamento básico, saúde, educação, indústria, agricultura, segurança, etc.), necessárias à superação do atraso e correção dos desequilíbrios existentes.

Sem uma ação efetiva de planejamento nenhuma política governamental terá capacidade de garantir sustentabilidade a um crescimento econômico e social duradouro que venha se materializar em desenvolvimento pleno da sociedade, possibilitando a reconstrução de um Estado em bases modernas e transformadoras, rompendo definitivamente com as amarras de um passado que ainda hoje insistem em permanecer como fantasma, obstaculizando mudanças revolucionárias. Mesmo assim, para que tudo isto possa tornar-se plausível e as novas políticas sejam concretizadas, é imprescindível que o governante se articule com a sociedade, ouvindo e pondo em prática suas demandas, rompendo definitivamente com as práticas clientelistas do passado de maneira que possa assumir o compromisso com um futuro inovador. Está na hora de se reconstruir o planejamento, para que o País se reencontre com o seu futuro, isto porque, sem sombras de dúvidas, o planejamento é realmente a arma capaz de destravar a engrenagem do desenvolvimento. Talvez seja sua ausência a principal razão da crise brasileira que se arrasta por longos anos e se aprofunda cada vez mais.

(Publicado no Caderno Mercado do Jornal da Cidade em 14/16 de maio de 2016)

Planejamento: um processo que precisa ser retomado para destravar o desenvolvimento


Dilson M. Barreto
Economista

O brilhante Economista e ex-condesiano Nilton Pedro da Silva sempre referenciava quando de suas palestras sobre o planejamento para o desenvolvimento: “o desenvolvimento é uma decorrência da construção de um mito: difunde-se esse mito e as pessoas, acreditando nele, lutam para que o mesmo se torne realidade”. Acontece que hoje em dia além dos sonhos deixarem de existir na prática, o mito do desenvolvimento foi sepultado faz algumas décadas. Os prenúncios de hoje ficam apenas nas palavras vazias dos governantes que não olham para o futuro, contentando-se com o curto prazo de suas medíocres gestões. Esquecem que, para haver desenvolvimento, as ações governamentais têm que ser focadas no longo prazo e de forma integrada, aliada a um processo de planejamento consistente e direcionado para objetivos estratégicos. O planejamento surge assim como uma necessidade premente para a construção de um processo de desenvolvimento. É impossível colocá-lo em prática se os governantes, arraigados à política tradicional do toma-lá-dá-cá, não acreditam na sua eficácia e na possibilidade de que, com sua aplicação, as mudanças econômicas e sociais venham ocorrer de fato.

Por sua vez, essa imperiosa necessidade de se promover o desenvolvimento para que haja progresso e bem-estar para a sociedade, traz como consequência um longo processo de formação de equipes multiprofissionais qualificadas, o que também hoje não mais existe, tornando difícil construir bases seguras para ações concretas voltadas para que a economia cresça com sustentabilidade e por longo tempo. De igual maneira, seria necessário que ao ser difundido esta nova prática de trabalho, os diversos segmentos sociais e as próprias lideranças políticas acreditassem nela. A introdução do Orçamento por Programas decorrente da Lei 4.320/64 revolucionou toda a estrutura orçamentária brasileira com a introdução de importantes conceitos como programas, projetos, atividades, abrindo os caminhos para se pensar programaticamente o desenvolvimento os País ou de uma determinada região. Todavia, a partir do desmonte do Estado brasileiro no Governo Sarney, a estrutura orçamentaria começou a ser distorcida, confundindo-se interesses reais de uma sociedade com os interesses político-eleitoreiros dos governantes. O desmonte do Estado brasileiro foi consolidado mais à frente com a introdução de políticas neoliberais voltadas para a redução ou mesmo anulação das práticas desenvolvimentistas até então em curso. Planejar passou a ser entendido como uma atividade a cargo da iniciativa privada, o que concorreu para tornarem amorfos tanto o Ministério de Planejamento como os órgãos regionais e estaduais anteriormente encarregados desse processo. O que era uma estrutura sistêmica, deixou de ser. Alterou-se a estrutura do Estado para atender ao fisiologismo político o que levou a tais órgãos se politizarem e, com a abertura política, passassem a ter donos, com atividades direcionadas para o atendimento dos interesses políticos de seus proprietários. Em consequência, as equipes técnicas foram marginalizadas, classificadas como elementos complicadores, o que serviu para consolidar as velhas estruturas socioeconômicas e políticas que pareciam estarem mortas. Nessa esteira do desfazimento, foram desfeitas as estruturas tecnoburocráticas que, inseridas dos diversos órgãos de planejamento, comandavam o processo calcado numa orientação técnica e na visão de futuro.

Tanto isto pode ser tomado como verdade que, desaparecendo as estruturas de planejamento a nível nacional e regional e esfaceladas as respectivas equipes profissionais, os órgãos estaduais foram enfraquecidos e a própria ideia de planejamento ficou totalmente distorcida, sendo materializada tão somente por dois instrumentos que, isoladamente, não materializam uma ação efetivamente planejada: a elaboração do Orçamento Anual e do Plano Plurianual. Gerou-se um vazio. Hoje, com a evolução da informática, a elaboração de tais documentos é procedida em curto espaço de tempo, sem qualquer discussão sobre necessidades e prioridades ou qualquer avaliação da eficácia dos programas e projetos anteriormente em curso. Voltar atrás é totalmente impossível. Todavia, assim o querendo os governantes, pode-se pensar e construir mecanismos novos que se adequem à atual realidade, para tanto sendo necessário tão somente vontade política e desejo efetivo de fazer a coisa certa. Focar o planejamento como prioridade, acreditar em sua eficácia para promoção do desenvolvimento econômico e social e, dentro dessa premissa, começar a trabalhar com objetividade, seria o remédio mais aconselhável para superar o processo recessivo que está se aprofundando cada vez mais. Resgatar o planejamento, montar novas equipes técnicas, qualifica-las convenientemente tendo como pressuposto pensar no futuro e as respectivas mudanças econômicas e sociais que necessariamente viriam a ocorrer, deveria ser o marco principal para a construção de um Brasil novo. Se tais pressupostos fossem absorvidos pelo Governo, quatro pontos teriam que ser perseguidos dentro de um processo de modernização e revitalização do Estado brasileiro: primeiro, motivação e a crença na construção de um processo de desenvolvimento mediante a realização de um trabalho sério e extremamente ordenado, totalmente descomprometido com compromissos político-eleitoreiros; segundo, compromisso do corpo técnico com a ação a ser realizada, para tanto exigindo-se a unidade e a qualidade técnica dos trabalhos a serem executados; terceiro, quando da institucionalização do planejamento, promover a formatação dos programas e projetos direcionados de modo que sejam alcançados os objetivos desejados; quarto, discussão sobre as necessidades e prioridades básicas do País, Estado ou região (energia, transportes, abastecimento d’água, saneamento básico, saúde, educação, indústria, agricultura, segurança, etc.), necessárias à superação do atraso e correção dos desequilíbrios existentes.

Sem uma ação efetiva de planejamento nenhuma política governamental terá capacidade de garantir sustentabilidade a um crescimento econômico e social duradouro que venha se materializar em desenvolvimento pleno da sociedade, possibilitando a reconstrução de um Estado em bases modernas e transformadoras, rompendo definitivamente com as amarras de um passado que ainda hoje insistem em permanecer como fantasma, obstaculizando mudanças revolucionárias. Mesmo assim, para que tudo isto possa tornar-se plausível e as novas políticas sejam concretizadas, é imprescindível que o governante se articule com a sociedade, ouvindo e pondo em prática suas demandas, rompendo definitivamente com as práticas clientelistas do passado de maneira que possa assumir o compromisso com um futuro inovador. Está na hora de se reconstruir o planejamento, para que o País se reencontre com o seu futuro, isto porque, sem sombras de dúvidas, o planejamento é realmente a arma capaz de destravar a engrenagem do desenvolvimento. Talvez seja sua ausência a principal razão da crise brasileira que se arrasta por longos anos e se aprofunda cada vez mais.

(Publicado no Caderno Mercado do Jornal da Cidade em 14/16 de maio de 2016)