Na última terça-feira (23) o Banco Central e o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) decidiram suspender integralmente o funcionamento do serviço de transferências e pagamentos do WhatsApp no Brasil. Desde 15 de junho, o aplicativo permitia que os usuários enviassem dinheiro a conhecidos e pagassem por produtos de empresas sem sair do aplicativo. O Brasil foi o primeiro a receber o novo recurso.
Segundo o BC, “é necessário preservar um adequado ambiente competitivo, que assegure a realização de avaliação de riscos para evitar o que considera “danos irreparáveis à competição, eficiência e privacidade de dados”.
A notícia pegou todos de surpresa, uma vez que o anúncio da operação de pagamentos por parte do Whatsapp havia sido anunciado com grande estardalhaço. Em nota à imprensa, o Facebook, controlador do WhatsApp, diz que vai trabalhar em conjunto com o Banco Central para retomar os serviços financeiros pelo aplicativo no Brasil, rapidamente.
Em entrevista ao site Olhar Digital, a advogada especialista da área contratual do escritório Finocchio & Ustras, Isadora Diniz, avaliou a motivação da ação do Banco Central frente as empresas envolvidas. “De um lado temos o WhatsApp, que tem um banco de dados com informações de milhões de brasileiros, e, ao mesmo tempo, você tem Visa e Mastercard que têm relevância no mercado; no âmbito business temos a Cielo, que é um serviço muito grande no mercado de intermediação de pagamentos. Por isso, deve haver um estudo do ponto de vista econômico de quais são os impactos dessa parceria para o mercado concorrencial brasileiro”.
O impasse abriu uma grande discussão e preocupou muita gente que espera a evolução dos meios de pagamentos. Para Alexandre Pinto, diretor de inovação e novos negócios da Matera, o desenvolvimento de sistema de pagamentos é de grande relevância, na medida que ele pode garantir a democratização do acesso aos serviços financeiros.
Segundo a Alexandre, a tecnologia tem papel importante nesse processo, mas os órgãos reguladores são fundamentais na implementação de novos modelos de pagamento. “Se você tiver um órgão regulador avesso à inovação, isso impacta bastante a evolução dos meios de pagamento”, diz.
Não é o caso do Banco Central, diz o diretor, que lembrou que o órgão está se preparando para lança o PIX, o novo sistema instantâneo de pagamentos e transferências do Banco Central. “Será algo transformador porque vai trazer aspectos para a rede de pagamentos que não existe na maior parte dos países do mundo”, explica.
“Com esse sistema será possível transferir dinheiro 24h por dia, 7 dias por semana, de forma online. Outro ponto é que ele não está restrito apenas aos bancos tradicionais, pois o Banco Central abriu essa rede para outros participantes como as fintechs, dando mais possibilidade que uma instituição de pagamento consiga se conectar e a partir daí ganhar uma interoperabilidade do nível do Itaú, Bradesco, etc, a um custo muito baixo”, diz.
Avanço nos meios de pagamentos
Independentemente do que vai acontecer em relação ao sistema de pagamento do Whatsapp, os pagamentos móveis via app vêm apresentando uma grande expansão, um movimento que deverá ser impulsionado no pós-Covid pelo mundo low touch, que evolui na esteira das preocupações dos consumidores com sua saúde.
De acordo com a segunda edição do estudo “Panorama dos meios de pagamento no varejo brasileiro”, desenvolvido pela Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) em parceria com a OfferWise, a adoção de meios de pagamento como apps e carteiras digitais foi acelerado pela pandemia: 70% das empresas entrevistadas fizeram alguma mudança em sua estratégia de meios de pagamento nos últimos 12 meses e 58% modificaram suas estratégias para lidar com os efeitos do Covid-19. Carteiras digitais, parcerias com marketplaces e empresas de cashback e QR Codes são as principais respostas do varejo para lidar com os efeitos do coronavírus.
“O uso mais intenso de meios de pagamento digitais é positivo para a economia do País, pois aumenta a formalização do mercado e torna mais fácil alcançar a população desbancarizada”, analisa Eduardo Terra, presidente da SBVC. Para ele, carteiras digitais e pagamentos via app não são mais uma tendência, como eram na primeira edição do estudo, de 2018. “Não é exagero dizer que avançamos cinco anos em cinco meses. O Covid-19 acelerou a transformação digital do varejo e a adoção de novos hábitos pelos consumidores”, afirma Terra.
O estudo fez uma radiografia dos principais meios de pagamento que são utilizados por consumidores e empresas do setor, mostrando que os meios digitais ganharam espaço nos últimos dois anos. Atualmente, 21% dos consumidores realizam pagamentos via aplicativo, índice que era de apenas 4% em 2018. A opção de pagamento móvel é oferecida por 62% das empresas, conta 13% há dois anos.
A pandemia também provocou uma aceleração no uso de meios alternativos, como o cashback, que saltou de 17% para 25%. Cupons de descontos e programas de fidelidade mantiveram índices semelhantes ao da edição anterior do estudo (31% e 22%, respectivamente). Por outro lado, 43% dos consumidores entrevistados dizem não usar nenhum desses meios de pagamento. “Essa é uma oportunidade para o varejo se fazer mais presente na vida dos clientes, oferecendo conveniência e vantagens financeiras como forma de criar um relacionamento mais sólido”, comenta o presidente da SBVC.
O estudo mostra que o tipo de pagamento utilizado pelos clientes varia conforme o tipo de compra e produto: normalmente, bens duráveis são pagos com cartão de crédito (muitas vezes parcelado), enquanto para as compras de consumo imediato o pagamento nas lojas físicas é realizado com cartão de débito ou dinheiro.
Para as compras online, o cartão de crédito é o principal meio. “A relevância do meio de pagamento é muito mais cultural do que tecnológica, e a sua evolução dependerá do comportamento das próximas gerações (nativas digitais) e de sua aceitação de meios de pagamento mais convenientes, integrados ao smartphone ou a wearables“, afirma Terra.
Fonte: Agência Brasil