A nossa entrevista da semana é com o Thiago Noronha Vieira, ele tem 29 anos, formou-se em 2011 em Jornalismo pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), em 2015 concluiu a graduação em direito pela Unit. O jovem advogado e pós-graduado em Advocacia Empresarial pela PUC/MG, também é sócio do Álvares Carvalho & Noronha – Advocacia Especializada. Thiago sempre teve interesse pelo setor de empreendedorismo, principalmente no que se refere ao ambiente ligado às startups. Mas foi em 2017, quando começou a pesquisar sobre o tema que descobriu o Caju Valley – um ecossistema de inovação e startups sergipano – depois foi aprimorando o conhecimento sobre as startups. E é justamente sobre isso que é a nossa conversa do Caderno Mercado com Thiago Noronha mostrará para você. Um breve resumo das startups em Sergipe. E o nosso entrevistado de pronto começa com uma provocação: “O que você vai fazer quando seu emprego não mais existir?”
Caderno Mercado (CM) – O movimento de Startup no Brasil ultrapassa os 10 anos, mas ainda há muito que esclarecer sobre esse segmento. Entretanto nos últimos seis anos o número de startups mais que dobrou no país. Essa é uma tendência que pende para os números positivos de crescimento?
Thiago Noronha: Sem dúvidas. Na verdade, é um movimento que se observa não só no Brasil, mas no mundo. Gosto sempre de começar com uma provocação: o que você vai fazer quando seu emprego não mais existir? Hoje, vivemos uma sociedade onde somos conhecidos pelo que fazemos. Eu, por exemplo, sou conhecido como advogado. Mas… e se a advocacia deixar de existir? De ser necessária enquanto profissão? É exatamente no seio dessas questões, das “dores” cotidianas que surge o empreendedorismo como vetor de soluções. As Startups são empresas ágeis, replicáveis e escaláveis que resolvem “dores” da humanidade em escala global. Pense, por exemplo, em empresas como Uber (Mobilidade), Netflix (Entretenimento), Ifood (Alimentação), Amazon (Logística/Consumo), Airbnb (Moradia). Todas essas empresas resolvem problemas básicos da humanidade em escala global com o uso da tecnologia para atingir um número expressivo de pessoas. E isso é o futuro!
CM – Qual o maior desafio para criar uma startup?
Thiago Noronha – Existem muitos! Mas diria que o principal desafio, hoje, é validar sua ideia. Muitas pessoas têm ideias e, em verdade, existe uma superestimação das ideias. Pensamos que elas são extremamente inéditas e ninguém pensou. Somos mais de 7,6 bilhões de pessoas, não é meio pretensioso achar que ninguém pensou em algo? Ainda que relativamente diferente, as ideias são parecidas. Então o grande desafio não é propriamente ter uma ideia genial, mas levar essa ideia à campo, experimentar, executar, medir, refazer, executar, medir (looping infinito) até de fato ter não só uma ideia, mas um negócio realmente palpável. Esse é, sem dúvidas, o maior desafio.
CM – Em 2018, o Brasil passou a ter startups que valem mais de US$ 1 bilhão. O aplicativo de transporte 99 e a Nubank, empresa que gerencia serviços financeiros, avaliada em mais de U$ 2 bilhões. Para alcançar esse êxito uma startup precisa passar por uma série de etapas, entre elas, o modelo de negócio. Seria na sua visão a etapa crucial, para que o caminho seja um pouco mais seguro?
Thiago Noronha – Muito se fala sobre o sucesso dessas empresas chamadas dentro do ecossistema de startups de Unicórnios (empresas com mais de um bilhão de dólares de valor de mercado), porém não há receita de bolo. Mesmo a 99 e a NuBank chegaram a essa cifra por motivos distintos. Mas, sem dúvidas, o modelo de negócios é um dos alicerces para o sucesso de qualquer negócio.
CM – A cultura brasileira de um negócio de talvez maior risco, demora a fazer com que o setor desenvolva mais e mais rápido?
Thiago Noronha – Eu não diria que a cultura brasileira de maior risco, mas certamente a cultura brasileira de ser avessa ao risco. O brasileiro é um povo essencialmente conservador do ponto de vista de investimentos. Ora, apenas 9,2% dos brasileiros investem na bolsa de valores, somente este dado já mostra o quão a nossa sociedade se comporta com relação a riscos. E, não à toa, o maior investimento do brasileiro continua sendo a poupança. As startups, obviamente, são negócios altamente arriscados, porém o risco é compatível com a recompensa. O problema é que nem todo mundo está disposto, ainda mais num país com a cultura do concurso público, a sair da sua zona de conforto e arriscar.
CM – Alguns especialistas no setor afirmam que é preciso que haja uma preocupação com qualificação profissional, porque o déficit de mão de obra pode prejudicar a competitividade. Você concorda?
Thiago Noronha – Concordo. Porém, esse déficit encontra escoras no nosso modelo educacional. Nós formamos pessoas para serem empregadas. Todo nosso modelo educacional é voltado para isso, até mesmo as universidades. Ou isso, ou o universo acadêmico ou o concurso público. Há poucos anos é que começaram a se voltar ao mercado e a ideia de formar pessoas para serem empreendedoras. Cadeiras como empreendedorismo, gestão, oratória e outras questões essenciais para o sucesso profissional foram introduzidas recentemente. O próprio curso de direito, por exemplo, carece dessa formação mais universal. Temos tantas cadeiras técnicas (do ponto de vista jurídico) que o que mais temos são profissionais altamente capacitados para atuar nos processos, mas que não sabem gerir sua própria carreira, sua marca, seu nome, suas finanças. Da mesma forma, a maioria das startups precisa de uma base tecnológica cuja mão-de-obra é escassa e disputada a tapa não só por empresas nacionais, mas também internacionais. E isso é algo que não se pode ignorar.
CM –É preciso que as Universidades preparem melhor os alunos para o mercado e competitividade?
Thiago Noronha – Com certeza. As universidades devem ser polos de conhecimento, mas também polos de soluções para a sociedade. Desde que entrei no ensino superior que escuto que ela é um tripé: Ensino, Pesquisa e Extensão. A extensão é o vetor do empreendedorismo que foi negligenciado durante anos. Formamos técnicos capazes de atuar como subordinados e não líderes para resolver problemas reais, chegou a hora de nos voltarmos, enquanto sociedade, e cobrar esse retorno.
CM –Como você avalia esse intercâmbio de estudos acadêmicos e experiências profissionais em Sergipe?
Thiago Noronha – Acho fantástico. Sergipe recebe muita influência de outros estados próximos. Eu mesmo sou um “imigrante” da Bahia e me orgulho muito de ter tido toda minha formação acadêmica em Sergipe. Acredito que o intercâmbio não só de pessoas de fora aqui, como também de pessoas aqui em outros estados e países, no médio prazo, vai produzir muitos resultados impressionantes capazes de projetar o estado como polo de inovação.
CM – Como definir essa nova geração de empreendedores de Sergipe que estão dedicados as Startups?
Thiago Noronha – Obstinados seria a palavra mais certa. É difícil falar quando se tem muito pouco. O Caju Valley é um grupo autogerido por pessoas e entidades que acreditam e se relacionam para pensar e resolver problemas. Todo pioneirismo carrega consigo um grau de risco grande, mas toda essa geração aceitou tomar esses riscos com os ônus e bônus de serem os primeiros a dar a cara a tapa. E isso é louvável!
CM – Quem tiver interesse em criar uma startup em Sergipe o que deve fazer primeiro? Quais as etapas para criação no Estado?
Thiago Noronha – Não existe uma regra. Acredito que o primeiro passo é estudar muito, se relacionar bastante e frequentar eventos relacionados às áreas de inovação e startups. Estar dentro do ecossistema é o primeiro passo para agregar os conhecimentos necessários para avançar. A startup é um negócio como qualquer outro, porém ela possui métodos mais ágeis e uma forma diferente de pensar. Ao invés de um modelo de negócio de várias páginas, você aplica o business model canvas. Ao invés de reuniões de 4h por dia, você faz um scrum de 15 minutos. E por aí vai… É muito do que já existe, aplicado de forma simplificada, ágil e efetiva.
CM – Você faz parte do Caju Valley onde as empresas realizam diversos encontros, podemos considerá-la uma instituição? Além disso é possível traçar uma perspectiva para o mercado sergipano?
Thiago Noronha – O Caju Valley, é bom que se diga, não é uma instituição. Não é uma associação. Não é uma federação. Não é um sindicato. É uma comunidade. É um ecossistema plural. Um ponto de encontro mensal, sempre num lugar diferente, para falarmos sobre negócios e ouvir ideias. Ajudar uns aos outros. Mas o Caju Valley não é um fim em si mesmo, ele é uma linha. Uma linha que faz parte de uma grande teia de pessoas, empresas e instituições que pensam em como avançar e posicionar Sergipe neste universo das startups. Perspectivas temos muitas. Recentemente tivemos o case da PaggCerto, a primeira startup sergipana a ser aportada por um fundo de investimento (Venture Capital), o Criatec 2, que certamente nos colocou no mapa nacional dos negócios inovadores. Mas temos vários outros negócios dentro do ecossistema que são cases, a exemplo do JUBS, do FilaZero e outros tantos negócios incríveis e bacanas em nosso estado. Inclusive, quanto mais pessoas, sobretudo empresários tradicionais, se voltarem e acreditarem nessas ideias inovadoras, maiores conexões e avanços teremos. Sendo assim, está tudo ligado, por isso que é uma grande teia. A perspectiva são positivas, desde que as pessoas estejam dispostas a essa troca.