Olimpíada é plataforma de inovação, relacionamento e construção de marca para anunciantes B2B e B2C
Mais tradicional evento esportivo do mundo, os Jogos Olímpicos se tornaram ao longo do último século uma importante plataforma de negócios para anunciantes dos mais variados segmentos e portes. A associação ao movimento olímpico possibilita a inovação de produtos e serviços, o relacionamento com consumidores e colaboradores, o aumento de vendas e a construção de marcas. Não é à toa que a vaga como patrocinador global, local ou até mesmo de fornecedor é extremamente disputada e cara — a cota principal pode chegar até US$ 300 milhões por ciclo olímpico.
Alguns anunciantes são aliados de longa data que construíram uma relação histórica com o Comitê Olímpico Internacional (COI). No entanto, nem sempre essa parceria foi uma realidade. A atuação de marcas com o COI se intensificou apenas alguns anos depois da Segunda Guerra, na década de 1950. A geração baby boomer, dos nascidos entre 1946 e 1964, causou um impacto econômico relevante e elevou o consumo e, por tabela, criou um período fértil para o marketing juntamente com o início das transmissões da competição pela TV, o que ampliou a exposição dos atletas.
A Coca-Cola fez parte dessa história. A marca iniciou suas relações com o Movimento Olímpico em 1928, quando enviou mil caixas de refrigerante para a delegação americana em Amsterdã, na Holanda. Agora, no Brasil, uma parceira longeva se vê diante de um novo desafio: ser a ponte entre os Jogos e o público jovem. “Com a chancela do comitê, queremos trazer o espírito olímpico com uma linguagem inovadora para os adolescentes”, explica Flávio Camelier, vice-presidente da Coca-Cola para os Jogos Olímpicos Rio 2016.
Segundo o executivo, ter a Olimpíada no Rio é uma oportunidade de gerar conexão com o brasileiro independentemente de seu interesse pelo esporte. “Por isso, estamos lançando ações que não se limitam às pessoas que terão ingressos e entrarão nas arenas, mas que atingirão um público maior”, diz. É a primeira vez, por exemplo, que a marca terá um espaço fora do Parque Olímpico totalmente focado em jovens, a Parada Coca-Cola. No local, os visitantes poderão entender sobre ícones olímpicos, como as medalhas, por meio de uma parceria com a Casa da Moeda. “Os participantes poderão ver como foram produzidas e também tirar fotos da tocha com câmeras 360º”, conta.
O apoio à Rio 2016 ocorre também em um momento em que a marca vem ampliando seu portfólio com itens considerados mais saudáveis, como sucos. De acordo com Camelier, as ações envolvendo a Rio 2016 são, sem dúvida, importantes para que a marca expanda a comunicação e mostre seu portfólio completo. “Estamos ampliando a distribuição de embalagens menores por todo Brasil, algo que também foi feito no Revezamento da Tocha”, destaca. Outra ação de marketing de oportunidade transformou-se em uma das parcerias mais duradouras entre uma marca e a Olimpíada. Em 1968, durante os Jogos de Inverno em Grenolle, na França, a delegação norte-americana se queixava de saudades de casa e do cardápio a que estava acostumada.
O McDonald’s decidiu, então, enviar hambúrgueres e cheese-búrgueres aos atletas de seu país. Começou aí um envolvimento direto com os organizadores e, em 1976, quando o COI organizou o primeiro evento com permissão para empresas atuarem como patrocinadores, lá estava a marca. A Rio 2016 representa o aniversário de 40 anos desse relacionamento.
Para cuidar de sua presença na competição, a rede de fast-food convocou o executivo David Grinberg, que assumiu o cargo de diretor de comunicação em março, mas desde 2010 já atuava no projeto olímpico. Sua responsabilidade era liderar o planejamento estratégico e patrocínio dos dois eventos no Brasil (Copa do Mundo, evento no qual está presente desde 1994, e Olimpíada) e, para isso, houve muita troca de informações com os colegas que tiveram o mesmo trabalho em Londres 2012.
O modo de ativar o patrocínio envolve lançar mão da consistência do que é perene, melhorando a cada edição. Um exemplo é o programa infantil, que começou a ser realizado em Pequim 2008. Foram recrutadas crianças no mundo todo e elas tiveram a oportunidade de viver o lado B dos Jogos, conhecer a Vila Olímpica, bastidores e atletas. Em Londres, houve também clínicas com atletas, que deram aulas às crianças e compartilharam essa experiência em um blog. “No Brasil conseguimos melhorar o pacote. Além das ações de Pequim e Londres, permitiremos que as crianças tenham participação direta na cerimônia de abertura. Pela primeira vez, cem crianças do mundo todo (42 brasileiras) participarão”, adianta Grinberg.
Melhorar as ações também é orientação para o restaurante que a marca instala na Vila dos Atletas desde 1996. Neste caso, isso implica incrementar a operação, a disponibilidade de produtos e a gestão interna. Além disso, ele é utilizado no programa de motivação para funcionários, que têm a chance de atender personalidades como Usain Bolt e Michael Phelps. A seleção dos colaboradores faz com que a rede detecte quem são e onde estão os melhores. Segundo Grinberg, o evento como um todo é usado para endereçar alguns pontos estratégicos de planejamento: retenção de funcionários, recrutamento e seleção, um processo que começa um ano antes. Já a campanha com as crianças reforça o tipo de abordagem que a marca quer dar aos públicos de interesse, enquanto a incorporação da assinatura dos Jogos em todos os pontos de contato aumenta a associação da marca ao evento.
“Algo que aprendemos é: não adianta querer abraçar o mundo. Em eventos da natureza de Copa e Olimpíada é fácil perder o foco”, conta. A máxima de que “menos é mais” deu certo para a o McDonald’s. Com três grandes ações, a empresa foi a segunda mais lembrada pelo público brasileiro durante a Copa de 2014, ficando atrás somente da Coca-Cola, numa relação de 20 patrocinadores oficiais. E esse será o caminho para a Olimpíada. O legado para a marca? Para Grinberg, ela sairá do evento com a reputação fortalecida, pois deixará claro ao público que contribui com a comunidade e oferece a melhor proposta de valor. Além disso, poderá aumentar sua presença junto ao consumidor, melhorar a comunicação e conhecer ainda mais sua própria força de trabalho durante a atuação num evento extremamente complexo.
Outro parceiro de décadas do COI é a marca suíça Omega. Em campanha recente relacionada à Rio 2016, a cronometrista oficial dos Jogos Olímpicos resgatou sua relação com o COI por meio da frase “Recording Olympic Dreams Since 1932” remetendo ao início da parceria. A Omega esempenha a função oficial pela 27a vez na Rio 2016 — e, diferentemente de outros parceiros, está presente nas arenas pois a cronometragem faz parte da disputa. De acordo com a companhia, o principal objetivo é ampliar sua plataforma de inovação e evolução de produtos. “Temos 450 toneladas de equipamentos no Rio e poder mostrar a precisão de nossos produtos é construir um atributo de confiança importante”afirmou a empresa em comunicado. Para causar essa associação, a Omega criou três modelos especiais para a Rio 2016, que serão item de colecionador.
Amor materno
Se o interesse do McDonald’s é falar à família, a Procter & Gamble, outro patrocinador global, elegeu a relação entre mãe e filhos como tema da sua comunicação olímpica. “A P&G mostra que quer ajudar muito a vida das mães, suas consumidoras, por meio de produtos de alta performance, porque assim elas têm tempo e qualidade de vida para ajudar seus filhos a desenvolverem seus talentos”, analisa Vanessa Silva, gerente de marketing da companhia no Brasil. A parceria da marca com os Jogos Olímpicos começou em 2010 e segue até 2020. A Olimpíada de Londres 2012, por exemplo, foi a plataforma de lançamento do novo propósito da companhia. Embora não faça lançamentos voltados aos Jogos Olímpicos, a P&G veste muitos de seus produtos com o símbolo olímpico, o que significa mais de 25 mil unidades distribuídas.
Outro ponto forte do patrocínio é poder desdobrá-lo junto aos seus parceiros do varejo. Até o momento foram 14 campanhas customizadas com redes como Droga Raia, Extra, Walmart e Guanabara. “Cobrimos 60% das lojas do Brasil”, diz Vanessa. As promoções — compra de produto e ganhe brinde ou compra de produto e concorra a ingresso — serviram para levar os Jogos para além do Rio. Tudo sob o controle rigoroso do COI, que aprova todos os materiais. “É o maior projeto multimarca que a P&G Brasil já fez”, revela Vanessa.
A campanha “Obrigado, mãe” recebeu u ma versão somente para o Brasil com a personagem da jogadora de vôlei. Além disso, as mães de quatro atletas patrocinados pela marca — Arthur Zanetti (ginástica), Jacqueline (vôlei), Ágatha (vôlei de praia) e Tiago Pereira (natação) — participaram de eventos e estarão juntas no Rio. A P&G também fará parcerias com alguns criadores de conteúdo, como o canal de humor Jacaré Banguela. Na capital fluminense, a multinacional terá salão de cabelereiros, para ativações das marcas de beleza, policlínica Oral-B, barbearia Gillette e até uma lavanderia de Ariel. Dentro da Casa da Família P&G, haverá o espaço P&G Experience, criado pela New Style, para o qual a companhia pretende levar 400 clientes. Nele, será montada uma loja ideal em realidade virtual. Coroando as ações, a companhia pretende entregar a todos os atletas olímpicos brasileiros uma carta de boa sorte escrita por suas mães.
Vitrine tecnológica
A sul-coreana Samsung começou sua experiência olímpica perto de casa, em Nagano, no Japão, em 1998. Já a realização dos Jogos no Rio de Janeiro tem sabor especial para a diretora de marketing da companhia no Brasil, a carioca Alessandra Barcala. Para a executiva, o patrocínio global aos Jogos está em sintonia com o posicionamento atual da empresa: “Meaningful progress comes from defying barriers” (“O progresso significativo vem do desafiar barreiras”). “A Samsung vem fazendo isso em tecnologia, com grandes lançamentos todos os anos, sempre querendo inovar muito mais e isso também é o espírito olímpico e dos atletas.
Eles não desistem nunca, estão querendo sempre se superar. Isso está superassociado com a marca e com o que a gente pensa em produto também”, diz Alessandra. O clima olímpico, por sinal, inspirou o lançamento de produtos: uma edição limitada do Galaxy S7 Edge e o Gear IconX, um fone de ouvido sem fio. Todos os atletas ganharão o S7 Olympic Edition, num total de 12,5 mil aparelhos. Além disso, 2.016 unidades numeradas serão vendidas, 777 delas atreladas a uma promoção na qual quem compra qualquer Galaxy S7 ganha um Gear VR e concorre à edição especial. O produto está sendo vendido na Alemanha, no Brasil, na China, na Coreia do Sul e nos Estados Unidos (a expectativa de vendas do IconX não é revelada).
Os lançamentos e a promoção são divulgados por campanha (TV aberta e paga, e mobiliário urbano) criada pela Leo Burnett Tailor Made, ações digitais, feitas pela Isobar, além de espaços chamados Samsung Studios, elaborados pela Cheil. O maior estará no Parque Olímpico (1.000 metros quadrados), mas também haverá áreas para experimentação dos produtos em São Paulo, Salvador e Porto Alegre.Balão de ensaios Marca líder e com atuação mundial, a Visa se aproximou dos Jogos pela primeira vez, em 1986, na edição de inverno no Canadá.
Também tem argumentos práticos ao seu negócio: ter o direito exclusivo sobre o evento como meio de pagamento, repassando direitos promocionais a clientes, como bancos (tem parcerias com o Bradesco, que é um patrocinador local), adquirentes e comércios, assim como em relação à venda de ingressos para as competições. “Todos podem falar seguindo uma série de regras do COI, mas de certa forma se apropriam dos eventos também”, diz Rodrigo Bocchicio, gerente de marketing da Visa e responsável pelos patrocínios da marca no Brasil. Mas as parcerias, embora privilegiem o Bradesco, não se restringem a ele. Banco do Brasil, Caixa e Panamericano são outros que têm cartões com a Visa. A empresa também lançou com o Bradesco a Pulseira Bradesco Visa, que está disponível exclusivamente no Brasil e será testada durante o evento mundial por cerca de três mil portadores selecionados. Eles poderão utilizar o equipamento em quatro mil pontos de atendimento. “Depois dos Jogos essa experiência terá continuidade com os emissores”, conta Bocchicio.
Outro produto que está sendo testado como meio de paga-mento é um relógio feito em parceria com a Swatch. Tanto a pulseira quanto o relógio usam a tecnologia de comunicação por aproximação (NFC). Os consumidores que não têm cartão Visa podem fazer emissão de um “pré-pago” eventual” para a compra de ingressos, o que acaba gerando à empresa uma base de dados com a qual poderá trabalhar depois.
O mesmo ocorre dentro das arenas. Outra inovação na Rio 2016 é que os atletas patrocinados pela Visa receberão um anel, também equipado com o sistema NFC, para fazer suas compras na cidade. “Estar associado a esse evento é estar associado a uma paixão das pessoas.Metade da população mundial acompanha a Olimpíada. É uma oportunidade de desenvolvimento de negócios quando temos algo novo para oferecer a nossos clientes”, avalia o executivo. Até o momento, mais de 34 iniciativas já foram realizadas ou estão em andamento, segundo ele, com 20 parceiros. As experiências em inovação de produtos e nos formatos de promoções também preparam a marca para os próximos eventos, como a Copa de 2018, na Rússia, e a Olimpíada de 2020, no Japão.
Mesmo não sendo uma parceira histórica dos Jogos, a GE, que está com o COI desde 2005 e mantém um contrato até 2020, vemaproveitando sua associação com o evento para ampliar a interlocução com o segmento B2C. “Apesar de a marca estar associada ao B2B, não existe na nossa estratégia de comunicação uma divisão. É uma coisa só. Claro que nosso intuito não é ter comunicação de massa, mas falar com um público mais abrangente do que somente empresas”, conta Pedro Alves, gerente de publicidade e comunicação digital da GE. A empresa dividiu sua estratégia de comunicação em três pilares: iluminação, saúde e energia, por meio de mais de 170 projetos espalhados na cidade do Rio de Janeiro. Dentre eles, a iluminação de 60% das arenas e campos olímpicos com lâmpadas de LED. “Apesar de o foco estar no Rio de Janeiro, a GE está mostrando que suas tecnologias estarão direta e indiretamente ligadas ao dia a dia, como nas turbinas dos aviões, nas transmissões televisivas e outros lugares”, explica.
Além de um manifesto lançado em 2015, que explicava a participação da GE na Rio 2016, a empresa desenvolveu uma websérie, lançada na terça-feira passada, 19, com os personagens Tíbio e Perônio, cientistas que fizeram sucesso no Castelo Rá-Tim-Bum, da TV Cultura, durante os anos 1990. “É a primeira vez que os personagens vão retornar e serão cinco episódios que estarão no formato 360º no digital. Será nossa principal ação no período.” O primeiro episódio fala sobre câmeras de segurança e centro de pesquisa, o segundo sobre iluminação, o terceiro sobre patrocínio da canoagem brasileira, o quarto de saúde e, por fim, o último trata dos Jogos Paralímpicos.
Nos bastidores
O trabalho de alguns patrocinadores olímpicos não é visível para o grande público, mas isso não impede a realização de ações de ativação. Parceira mundial e companhia química oficial dos Jogos Olímpicos, a Dow concentra suas iniciativas em três frentes: investimentos em infraestrutura, ações de cobranding e mitigação decarbono da Rio 2016 — a primeira vez que o COI fez a compensação da emissão de gás carbônico via créditos de carbono foi em 2010, nos Jogos de Inverno de Vancouver. A empresa está envolvida em 20 projetos conectados com os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016, abrangendo desde tecnologias dentro do campo até a construção, transporte e infraestrutura da Vila Olímpica e da cidade-sede. Entre eles estão desde a instalação do gramado sintético nas áreas de competição de hóquei ao fornecimento dos materiais químicos de revestimento e construção utilizados no acabamento dos prédios que irão abrigar competidores de mais de 200 países.Guilherme Dias, líder comercial da Dow para os Jogos Olímpicos na América Latina, explica que ser um parceiro olímpico vai além de ações de comunicação para a empresa. “Usamos o esporte como um canal para a geração de negócios. Podemos explorá-lo para mostrar nossas soluções e nos comunicar com o mercado”, afirma, antecipando que o esporte também será usado após a Olimpíada para a ampliação da atuação da multinacional na América Latina.
Outra empresa que atua nos bastidores do evento é a Cisco. A empresa fornece infraestrutura para os Jogos e pretende utilizar a Rio 2016 para ampliar seu diálogo com o público em geral. “O projeto dos Jogos Olímpicos começou há mais de quatro anos, em Londres. Somos apoiadores oficiais para equipamentos de rede”, diz Eduardo Campos, diretor de marketing da Cisco Brasil. De acordo com o executivo, o patrocínio faz parte de um investimento estratégico de mais de R$ 1 bilhão da companhia no País, que inclui um centro de inovação inaugurado no Rio em 2013. “O patrocínio está num contexto muito maior de presença de marca e portfólio e também ajuda a ampliar nossa interlocução além do B2B”, destaca Eduardo.
Début
Embora tenha um histórico longo em patrocínios esportivos, a japonesa Bridgestone está inaugurando na Rio 2016 sua participação como patrocinador mundial do evento. Patrocinadora da Fórmula 1 de 1998 a 2010 e atualmente parceira da Fórmula Indy, a empresa tem uma divisão que vende de taco e bola de golfe, a bola de tênis e bicicleta.
Associar a marca à Olimpíada após estar presente em outros esportes há tanto tempo é, segundo Eduardo Corch, gerente de marketing da companhia no Brasil, um processo natural de mudança de estratégia de investimentos. “Fizemos uma migração de esportes automotores, saímos da F-1 e é natural procurar outro grande evento”, explica.
Também faz sentido o acordo assinado com o COI em 2014 com prazo até 2024, já que o Japão, sede da companhia, receberá os Jogos de 2020. No início do evento, dia 5 de agosto, a fabricante colocará no ar uma campanha global, feita nos Estados Unidos, com participação ativa da equipe local. O filme, segundo Corch, será bastante agressivo e positivo, e aumentará o brand awareness. A verba de marketing da companhia subiu 40% este ano no país.
Meio e Mensagem
Por Luiz Gustavo Pacete e Roseani Rocha
Colaborou Teresa Levin