Fofoca no ambiente de trabalho causa efeitos que vão além do clima ruim entre os funcionários. O problema pode ocasionar prejuízos diretos às empresas. Decisões da Justiça têm condenado empregadores a indenizar por danos morais funcionários vítimas de boatos e intrigas, nos casos em que fica comprovada omissão da companhia. Os valores variam entre R$ 5 mil e R$ 30 mil.
Em um dos casos, o Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo condenou uma loja a pagar R$ 10 mil de indenização a um vendedor alvo de boatos acerca de suposta traição da mulher. O processo aponta que os próprios donos do comércio teriam espalhado boato de que o filho esperado pela esposa do vendedor seria de outro homem.
O Caso de São Paulo
Um empregado que tinha sua vida pessoal exposta por meio de comentários vexatórios feitos por seus superiores hierárquicos no ambiente de trabalho teve acolhido seu pedido de indenização por danos morais, em sede de recurso ordinário (interposto contra decisão de 1ª instância). Uma testemunha do funcionário confirmou que presenciava esses comentários feitos em público, e que via a vítima com os olhos marejados.
Os magistrados da 9ª Turma do TRT da 2ª Região destacaram: “A vida privada, a honra e a intimidade são valores fundamentais da pessoa humana, devendo ser resguardados (CF/88, art. 5º, inciso X). Fofocas sobre a vida pessoal do trabalhador no ambiente de trabalho normalmente têm natureza vexatória, causando humilhação e constrangimento perante os demais colegas de trabalho e terceiros, ensejando a reparação por danos morais”.
No acórdão, de relatoria da desembargadora Sônia Mascaro Nascimento, os magistrados condenaram o empregador ao pagamento de R$ 10 mil em caráter compensatório e pedagógico da reparação pela ofensa moral.
O caso do acusado de furto
Outra empresa teve de pagar R$ 30 mil a um funcionário demitido por furto, sem que o empregador tenha comprovado o ato. No setor em que ele trabalhava, eram fortes os rumores de que o funcionário seria um dos responsáveis pelo sumiço de celulares. O funcionário chegou a ser revistado e levado por seguranças até a saída da empresa. Ao decidir por conceder a indenização, o relator do processo considerou que essas situações atentaram contra a dignidade, integridade psíquica e o bem-estar individual do ex-empregado.
Zelar pelo bom ambiente de trabalho é um dos deveres da companhia, acredita Juliana Bracks, advogada trabalhista do escritório Bracks Advogados Associados. “Se a companhia tem conhecimento de um boato que deixou uma pessoa constrangida, precisa tomar alguma medida “, afirma. Autores de fofocas podem ser demitidos, em alguns casos até por justa causa. Recentemente, o TRT de Rondônia manteve o desligamento de uma funcionária que espalhou pelo aplicativo WhatsApp um áudio para dizer que seu supervisor casado traía a esposa com outra funcionária da empresa.
O caso da fofoca da traição
A 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região (RO/AC) manteve em decisão unânime a demissão por justa causa de uma ex-empregada da L.L.B.R. Distribuidora, acusada de espalhar boato na empresa que envolvia seu superior hierárquico e outra empregada sobre um suposto caso extraconjugal.
O colegiado julgou o recurso ingressado pela autora que pretendia a reforma de decisão da 1ª Vara do Trabalho de Rio Branco (AC), que indeferiu os pedidos de nulidade da dispensa por justa causa, de reversão da dispensa por justa causa para desmotivada, bem como o pagamento de verbas rescisórias e de alvará para habilitação referente ao seguro-desemprego.
Na análise do recurso, o desembargador-relator, Carlos Augusto Gomes Lôbo, com base nos depoimentos colhidos nos autos, inclusive da própria reclamante que confirmou a conduta ilícita praticada. O resultado da prova oral encontra-se permeado de elementos de convicção robustos e, por conseguinte, aptos a respaldar a motivação atribuída, pelo empregador, à dispensa da empregada, por justa causa, o que impõe a manutenção da decisão de base, argumentou.
De acordo com relator, o ato faltoso da ex-auxiliar administrativa vai de encontro com as hipóteses previstas no artigo 482, k, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), entendendo que estavam presentes os requisitos para a aferição da ocorrência da justa causa no que se refere à previsibilidade (tipificação legal), gravidade da falta, imediatidade, nexo de causalidade e singularidade na aplicação da pena.
Amplamente demonstrado o ato lesivo da honra ou da boa fama praticado pela autora, a ensejar a despedida por justa causa. Não havendo que se falar em transmudação de dispensa, tampouco em pagamentos de verbas salariais correlatas à dispensa sem justa causa, concluiu.
O que as empresas podem fazer no caso de fofoca?
Segundo Daniel Chiode, sócio do Chiode Minicucci Advogados, para se proteger, já há empresas formulando uma ata notarial com cópia da tela do celular para comprovar a fofoca e os motivos da demissão por justa causa . “A empresa, tomando conhecimento, tem que punir os envolvidos e até mesmo o administrador do grupo , se funcionário da companhia, por não ter coibido a fofoca”, destaca.
Chiode conta ter participado este ano de pelo menos dez investigações internas de empresas para apurar essas práticas. “As investigações começam e não temos controle de como vão terminar. Às vezes começam com um pequeno boato e no fim há casos de corrupção, prostituição e assédio sexual, entre outras coisas”, afirma.
Segundo ele, as redes sociais e o uso do WhatsApp tornaram a questão muito mais complexa para as companhias, que tiveram que passar a monitorar a vida virtual de seus funcionários.
Para evitar processos, advogados trabalhistas aconselham as empresas a adotar códigos de éticas e condutas claros. Segundo Juliana, é preciso divulgar de forma objetiva as regras e orientações. A advogada ainda destaca a necessidade de se abrir um espaço para denúncias, o que facilitará as investigações. E caso seja detectado de onde partiu a fofoca, acrescenta, a empresa pode advertir, suspender ou até demitir por justa causa os envolvidos.
Em uma pesquisa realizada pelo Portal Linkedin, em 2011, sobre o que mais incomodava profissionais brasileiros em suas rotinas de trabalho, foi constatado que o excesso de fofoca era o principal problema. Foi citado por 83% dos entrevistados.
Fonte: Valor Econômico/ TRT-SP/ TRT- RO /Supermercado Moderno